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imagens da vida e da arte

domingo, 7 de março de 2010

A luci(n)dez de Elisas, Anas, Carolinas, Aldas e tantas operárias.

Era uma vez, um grupo de operárias novaiorquinas que recebia 1/3 a menos que o salário masculino e trabalhava 16 horas diárias. Precisavam ganhar mais e trabalhar menos. Resolveram protestar por uma jornada de 10 horas e, em 8 de março de 1857, centro e trinta trabalhadoras protestavam no interior da fábrica, quando um incêndio pôs fim aquelas vidas e suas modestas reinvindicações. Para que essa história não fosse esquecida, em 1910, outro grupo de mulheres instituiu o dia 08 de março como dia Internacional da Mulher.

E assim são criadas as datas, com a melhor das intenções. Mas, um século depois, sob o efeito showbiz com o qual pretendem transformar a vida em festa glamurosa, virou festa esse dia.

Dia que rende comemorações no mundo inteiro. Festa da mídia empenhada em lembrar a todos das lingeries, chocolates e jóias que não devem ser esquecidas nessa data que confirma a importância da perfumaria para a existência feminina.
Decididamente, os tempos modernos dispersaram as cinzas que traziam a lembrança dessa data como momento de reafirmar direitos e medidas que possibilitem um cotidiano em que a condição feminina possa ser admirada, dispensando esse dia cenográfico em que flores e sorrisos são incorporados aos protocolos oficiais de homenagem.

Mas, nessa lógica que move o mundo, cabe aplicar a velha lógica machista que predomina sobre a vida feminina: ruim com ele, pior sem ele...



Eu me rendo: que venha mais esse dia! Nele fabricaremos mais doses da resistência queimada na fábrica para dar conta da rotina hard do século XXI, na qual triplicamos a jornada para escapar da história comum à maioria das mulheres que, dentro dos estabelecimentos espalhados pelo mundo, trabalha tanto e ganha tão mal quanto as operárias do passado.

Antecipando a festa, um jornal diz que “a beleza acústica e rítmica da pandeireta de Ana Carolina” já comemorou a data em Luanda, onde há também o dia da mulher angolana. "É isso aí", nessas bandas onde toda sexta-feira é dia “do homem” e do vale tudo masculino, o esforço para fazer crer no valor feminino é duplo.

Toda mulher gosta de rosas, canta a moça da pandeireta, mas, não bastam as flores e a música para mulheres que tem conhecido apenas espinhos e ruídos de um cotidiano privado da leitura, da escrita e calcado apenas na arte de sobreviver sem arte, sem pão, sem teto, lutando sempre para escrever uma história para os muitos que dela descendem e dependem.

Que em todos os cantos e em todos os dias vinguem os eventos que potencializem a qualidade dos seres humanos, minimizando o ato de resistência exigido da mulher.
Dedico minhas palavras às mulheres que não podem lê-las. As que lerem indico as palavras de Alda Lara, Carolina Maria de Jesus, Alda Espírito Santo, Conceição Evaristo, Sueli Carneiro e Elisa Lucinda, operárias da escrita, cuja lucidez nos deu obras literárias que refletem o existir, resistir e produzir próprios ao ser feminino em nosso mundo.

2 comentários:

  1. Eu lhes dedico, nós mulheres todas, as palavras em arma poética da historiadora Bestriz Nascimento. Flores coloridas, viçosas e guerreiras para todas nós! Abraços

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  2. PARABÉNS MULHER,
    Por assumir a voz delas e de nós todas; por tocar na música nossa sem dançar como os outros querem.
    Obrigada por partilhar a consciência, a resistência e a "cumplicidade" da luta.
    Bom trabalho, boa sorte...a gente se fala um dia desses.

    Mantenha/Sodádi.
    G

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