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quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Palhaçada é outra história!

10 de dezembro
Confesso que desconhecia a existência do dia do palhaço... Desde que soube, esta manhã, passei a analisar a utilidade de uma data que serve para destacar os profissionais desta arte circense, daqueles que, no cotidiano, nos mostram o lado pejorativo da palhaçada.

Hoje, quando assistia a um programa matinal global, testemunhei um ritual de tortas arremessadas por duas das mais expressivas apresentadoras da TV brasileira. Para definir aquele grotesco espetáculo de alimentos desperdiçados à hora do café, quando tantos passam fome, exclamei: palhaçada. Então, despertei para o sentido depreciativo que a palavra assumiu em nossa linguagem.

Indignada com o uso do alimento e da linguagem, pensei neste post, escrito para falar da valorização de uma arte popular, como boa parte do público que assistia a esta farra das fartas louras. Retiro o que disse, sobre isso ser uma palhaçada, e reitero meu desejo de que no próximo ano, as estrelas troquem o ritual e “brinquem” de outra forma com o alimento, que pode, por exemplo, ser “lançando” na boca faminta de parte da audiência formada por gente empobrecida, a quem o circo eletrônico chega com mais constância que o pão.

http://maisvoce.globo.com/MaisVoce/0,,MUL782081-10345,00.html

Acima, o link onde quem não viu pode ver e me ajudar a escolher outro adjetivo para a cena... Embora seja inegável que ela contém os maneirismos ridículos que caracterizam o palhaço...

Daqui por diante, vale a torcida por uma geração de novos palhaços e palhaças que surgiram nos circos contemporâneos, além daqueles que migraram para o teatro infantil como os Parlaptões, as Marias da Graça e muitos outros, que renovaram a indumentária e o repertório deste personagem que resiste. Aqui sim, reside uma tradição.

Caminhando pro final, volto ao que poderia ser início deste post e faço minha homenagem aos palhaços sem grana e sem glória, que trabalharam no ofício de alegrar. Alguns deles, anônimos, ficaram apenas na memória dos que os assistiram e riram.

Finalizando, quero divulgar o nome e a história de Benjamin de Oliveira, filho de escravos, que no circo teve liberdade para criar o Palhaço Benjamin. Nascido em 1870, no Pará, Benjamin atuou em inúmeros circos, foi cantor e criador da pantomima Os Guaranis, apresentada em 1910, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.

Retomando a confissão, digo que até pouco tempo não sabia que um dia houve um palhaço negro e tão significativo para essa outra história de falar da palhaçada como arte. E, se um dia me disseram que o nome da Praça Onze é Praça Benjamin de Oliveira, esqueci completamente. Aparando esses desconhecimentos, divido com vocês alguns dados sobre a carreira deste homem, cujo nome significa “filho da felicidade”, que movimentou o cenário artístico no início do século XX, somando realizações que permitem apontá-lo como criador do circo-teatro do Brasil.

Meu abraço aos palhaços que passaram pelas lonas e palcos de nossas vidas, alguns deles, organizados e representados no link abaixo, ainda teremos o prazer de ver e aplaudir por aí. Quem acessar o link terá informações mais apuradas sobre Benjamin e sobre "ser palhaço" de fato e ofício.

http://www.mundoclown.com.br/benjamimdeoliveira

Aos leitores e professores de plantão, cabe divulgar o livro Benjamin, o filho da felicidade de Heloísa Pires Lima.

3 comentários:

  1. Simone,

    Eu, apesar da minha curta vida, já fui mágico. Fazia apresentações em festas, eventos. A carreira foi curta, mas gostosa, me rendeu boas diversões. Mas estou falando isso pra confirmar sua impressão de que nunca havia ouvido falar de palhaço negro. Eu também não.

    Mágicos, então, eram todos brancos, muito brancos, ou orientais. Eu sou o único mágico negro que já conheci, e nas rodas que eu frequentava com o meu professor, todos me estranhavam, embora eu sempre tenha sido bem recebido e nunca tenham fechado portas para mim (não sei como seria mais lá na frente, se eu tivesse me tornado um profissional, mesmo... você bem sabe que quanto mais alto vamos, mais as portas vão se fechando, certo?). E também não sei como seria se eu fosse negro de pele bem escura, mas enfim.

    Sabe como o racismo chegava a mim entre os mágicos? Eu gostava de usar fraque e fazer o show ao som de um classudo jazz ao fundo. Diziam que não. Que eu tinha que providenciar um turbante e uma música árabe. Olha a galera querendo me colocar como o Outro. Flagrante, não? Pena que eu tinha 14 anos e não conseguia enxergar essas coisas. E, quando decidi deixar os cabelos crescerem, mesmo ainda no início, com os primeiros cachos se mostrando, foi o fim. Me diziam que mágico tinha que ter cabelo curto. Só que esqueceram de dizer que mágico NEGRO é que tinha que ter cabelo curto, porque eu cansava de ver mágicos brancos de cabelos muito lisos longos, fazendo aquele estilo entrevista-com-o-vampiro. Nesse ponto, eu já estava abandonando a carreira, então ficou por isso mesmo.

    Mas, olha, até no circo, aquele mundo da imaginação dentro de uma lona, onde tudo é lindo e possível, até ali, os estereótipos raciais acontecem. Pode negro? Pode, mas acho que, no máximo, acho que para os números atléticos, de trapezismos etc. Realmente, tenho que concordar com uma amiga minha que dá pra fazer leituras raciais de praticamente tudo.

    Então, se o primeiro palhaço brasileiro foi um homem negro, possivelmente um dos iniciadores do circo no Brasil, o que aconteceu depois? Ironias sem graça desta nossa terra da democracia racial.

    Beijo,
    Rafael.

    PS: Hum, isso que eu escrevi pode virar um post também, hein? Prometo que dedico a você, se vier.

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  2. Rafa,

    adorei esse pré-post rs Com seu texto lembrei de um apontamento do M´Bokolo, onde ele faz referência aos "transmissores de testemunho" existentes na África Austral. Acho que em nossas "leituras racias" vamos assumindo esse papel cotidianamente e, com isso, nossas experiências vão ajudando a ler o livro do mundo.

    BjkSi

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  3. Este texto teu transportou-me ao passado - nas brincadeiras de circo quando eu era pequenino. É bom saber que para o riso, a palhaçada também possui dia! Amei o texto.

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